Exposição Prolongada à Ficção Científica  

   um blog de Luís Filipe Silva


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11 Setembro 2011

Destaque Para Dois Artigos Sobre a Influência Mútua entre ficção popular e realidade, como início de um debate mais extenso nestas páginas (por motivos que em breve se tornarão evidentes). O primeiro é «The Subversive Ability of Popular Culture: Superhero Movies Post 9/11».

Se somos uma espécie única por vários motivos, celebrar aniversários figura sem dúvida perto do topo da lista. Passamos a gerações futuras uma chamada de atenção para certo evento que a actual considera importante. Mas até a importância se desvanesce no tempo, mistura-se com outras celebrações (veja-se o caso do Natal) e pode inclusive perder significado. Na nossa luta por manter uma memória colectiva, honramos tradições, mesmo quando já perderam a aplicabilidade. A História tem a sua própria inércia e como Leiber bem nos mostrava em The Big Time, as explosões sociais do passado propagam-se para o futuro como ondas de choque. 

Algo que celebrar aniversários nos permite é definir períodos de análise. A realidade é uma telenovela infinita que dificilmente se sumariza - daí a necessidade de estabelecer fronteiras temporais e excluir tudo o que possa ter dado origem a, ou ter derivado de, um movimento artístico, por muito que a cultura seja contínua e não discreta, e os criadores sejam tão influenciados pelas tendências da juventude como pelo discurso da actualidade. Dito por outras palavras, o princípio de uma história é sempre o fim de outra. Considerar, como o faz o autor do artigo, que a reconquistada popularidade do superherói nas salas de cinema traça um paralelo com o choque pós-traumático de uma América ferida não deixa de ser pertinente e adequado, mas ignora o fenómeno de fascínio da nova tecnologia audiovisual em apresentar-nos de forma convincente novos mundos ou transformações realistas do existente - roubando à FC a extrema verosimilhança (e logo, a audiência) que sempre se lhe exigiu. Ignora que se dirige a uma faixa etária pouco preocupada com o passado, mergulhada no presente e atenta ao futuro, que vai desconsiderar muitas das referências apresentadas se não for confrontadas com elas, diariamente, nos telejornais. Ser-se convincente, neste contexto, implica ser-se actual, reflectir as preocupações do jornal da véspera e das entradas mais recentes dos blogues: a ficção popular envelhece quase tão rapidamente quanto as notícias, e como elas, em breve se encontra no lixo. Por isto, é difícil encontrar nela reflexões ponderadas - não representa diligência argumentativa - não se preocupa com a justiça nem com a objectividade. Se o trauma ainda está fresco, e para não dar a parecer que alguém pretende lucrar publicamente com ele (já bastam os políticos e os anunciantes), a abordagem passa pel discurso conservador, aceite comumente pela sociedade, pela crítica fácil e pelas anedotas de ocasião. O que resulta em que estas histórias sejam encaradas como espelhos para efeitos de história literária: fórmulas concentradas de crenças e receios na sua forma pura (expurgada de acontecimentos, desapropriada de personagens, universal), recolhidos enquanto o trauma está vivo.

Só a ficção popular - escrita para se vender hoje, para consumir já, para se esquecer amanhã - tem verdadeiramente esta capacidade.

Talvez o fenómeno mais interessante seja o descrito no artigo seguinte, «Trauma, Morality & Conformity: American (Super)Heroes After 9/11». Os criadores dos superheróis viram-se, talvez, com o ataque mais feroz à sua arte, desde sempre. Que se tenham sentido obrigados a reagir ao mundo real e a incorporar nas histórias uma evocação do ataque às Torres, é testemunho do sentido de comunidade do género e do nível de sofisticação que conseguiu atingir - no sentido de confiar nos leitores, no veículo de comunicação e na maturidade da história. Também, talvez, um apelo à sobrevivência - não na mera questão comercial, mas no sentido de legitimar a impotência dos ditos superheróis em prever e precaver o desenlace. Na sua pequenez, os artistas gostam de pensar que contribuem para melhorar o mundo.

«Se os clássicos são eternos, a ficção popular identifica uma geração.»

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11 Setembro 2011

Os Prémios Hugo de ficção científica foram atribuídos no dia 20 de Agosto em Reno, Nevada, EUA, durante a Worldcon, que é como quem diz, encontros mundiais de ficção científica. A selecção bastante desanimadora de finalistas deu lugar a uma escolha ainda mais desinspirada, a de Blackout/All-Clear, um extenso livro dividido e vendido em duas partes na qual Connie Willis repisa o trilho já gasto da sua premiada (e mais interessante) novela «Fire Watch» de há umas décadas. Reviver o Blitz em plena Inglaterra da Segunda Guerra tem sido um fascínio desta autora, mas quem já leu o livro ficou desanimado pela escrita pesadona e pelas incongruências histórias. Por cá, reservamos a opinião até termos oportunidade e paciência em abri-lo. Outras selecções desinspiradas atribuem a vitória de um episódio do Dr. Who na categoria de obras visuais dramáticas curtas - a mesma que equiparava Shaun Tan à brincadeira de uma cantora que nunca devia ter passado de brincadeira. O triste desta evidência é perceber o quanto este prémio, que devia defender um padrão de qualidade e uma exigência crescente a nível literário, se afastou do propósito. Obviamente que não ajuda o facto de as escolhas surgirem por votação pública, mas se antigamente havia uma equiparação entre gostos e obras que se tornaram clássicas, actualmente essa utopia encontra-se cada vez mais longínqua de acontecer. Ou os gostos dos leitores mudaram ou há cada vez menos leitores. Não deixo de pensar que Willis, que tem uma presença divertida em palco, foi escolhida, pelo núcleo duro que participa nestes encontros, mais pela sua personalidade do que pela sua escrita. Se a tendência permanecer, talvez seja oportuno tornar a designação do Hugo no «prémio atribuído pela malta da Worldcon aos livros que interessam a esta malta».Link: Assistir em diferido à cerimónia de entrega dos prémios.

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