24 Abril 2010
Confesso Um Saudosismo pelos debates públicos de antigamente, em que cronistas se degladiavam, cada qual no seu espaço próprio de jornal ou da rádio, trocando opiniões, insultos velados e galhardetes, comentando o comentário do outro sobre um anterior comentário do primeiro. Uma literatura em hipertexto, mas diferido no tempo e que nos obrigava a sair à rua e comprar o jornal de modo para clicarmos na hiperligação. Opinar, por sua vez, implicava escrever uma missiva e enviá-la à redacção. Era um processo mais pausado, naturalmente; por outro lado, isto permitia alguma reflexão, e mesmo que as posições fossem incendiárias, ao menos havia uma noção de texto literário, aquela responsabilidade de escrita a que só a palavra impressa obriga.Daí que encare as caixas de comentários como algo de certa forma acessório, embora convidativo à participação; destinado a informações breves e pequenas conversas, mas não apropriado ao debate. O debate sério deve ser conduzido no espaço mais nobre do post, tentando evitar o fenómeno da resposta instantânea que normalmente conduz a resultados infelizes, sabendo-se que, nesta era de hiperligações e googlismo, é muito difícil a mais tímida frase conseguir esconder-se durante muito tempo no mais recôndito dos sítios Web.
Ainda assim, se este blogue não tem actualmente comentários, foi tão somente por uma questão técnica. Não sendo suportado por tecnologia proprietária, mas por um sistema de content management pessoal (cada qual com a sua mania) que vai sendo desenvolvido com esforço na obra e graça dos tempos livres - os quais há meses que não me visitam - significa que a funcionalidade regressará mas ainda sem data marcada. Uma regra vai manter-se: a aprovação dos comentários para que se tornem visíveis. Isto não está relacionado com questões de anonimato mas de decência e pertinência. Tal como em casa, gente rude e maltrapilhos sem educação ficam à porta. E se querem afixar publicidade gratuita, tenham a gentileza de pedir «por favor» e «com licença» ao dono, ou no mínimo apregoar produtos que sejam do interesse dos leitores do sítio. Sejam criativos, inesperados, inteligentes, irónicos, sarcásticos, irreverentes, informativos, mas acima de tudo, adultos. O dia que amanhã se comemora trouxe-nos um novo tipo de Liberdade há algumas décadas, parido com suor e lágrimas. Infelizmente, há quem não perceba que até a liberdade tem Manual de Utilizador. E se a gente rude e mal-educada tiver mesmo necessidade de expelir o conteúdo intestinal que lhes sai da boca, é perfeitamente livre de criar os blogues e fóruns gratuitos que queira - mas longe daqui, para que não se sinta o cheiro.
Creio que esta posição aborda a preocupação da resposta a esta reacção. O Rogério explica melhor (algo que não era obrigado a fazer, mas a que generosamente se voluntariou) os critérios que orientaram a sua escolha dos livros portugueses na mostra internacional. Tem razão quando afirma que há pouca FC nacional na passada década e foi pertinente lembrar-se da disponibilidade das editoras. Infelizmente, este rigor nos critérios não foi seguido pelos restantes participantes e acabou-se num resultado desigual, surgindo Portugal como um dos que teriam menos a oferecer. Por vezes, nestas coisas, é preferível pecar por excesso, e ir além dos limites da pergunta. Diga-se de passagem que, a nível de Espanha, por ser o outro mercado que acompanho com alguma regularidade, estou convicto de haver um bom par de exemplos que muito dificilmente teriam interesse aos leitores anglo-saxónicos... Bem, haverá certamente outras ocasiões.
Fica o apelo à reflexão ou debate sobre clássicos e FC, que tenho a certeza que não vai acontecer. Existe uma grande apetência para discussões acesas sobre temas generalistas, muito pouca sobre livros em concreto. Passar da fase do «gosto/não gosto» para a da interrogação sobre a pertinência do tema, a integridade da estrutura, a boa ou má caracterização dos personagens. É com grande pena que não encontro vontade para estes debates nos fóruns, e talvez a principal razão pela qual não contribuo. Creio que ainda não é desta que vamos saber se, na mente dos leitores, Os Caminhos Nunca Acabam será o primeiro grande clássico da FC portuguesa...