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Ricardo Loureiro - Crítica | 16 Out 2006
Dan Simmons é um quase desconhecido do público leitor português. Cinicamente diria que talvez quando um dia estrear um filme baseado numa obra dele essa situação se inverta. E é uma pena que assim seja porque Simmons, vencedor de prestigiosos prémios como o World Fantasy, o Bram Stoker e o Hugo merecia melhor sorte. Em Portugal apenas um romance dele foi publicado, A Canção de Kali (Song of Kali, 1985), que recentemente foi reeditado pela Saída de Emergência. A Canção de Kali foi o primeiro romance de Simmons e de imediato lhe granjeou o prémio World Fantasy.
Mas só este romance é escasso quando na carreira de Simmons se contam mais de duas dezenas de romances e colectâneas. Sabe-se que o primeiro dos romances de FC dele, Hyperion, se encontra integralmente vertido para a nossa língua e aguarda - pacientemente, diria - um editor. Sendo este um autor que se movimenta agilmente através de géneros como sejam eles o Horror, a FC, o mainstream, ou até o Policial/Espionagem, podia-se esperar uma maior atenção das editoras nacionais para com a sua obra. Já sobre esta movimentação inter-géneros remeto o leitor para o interessante artigo Dan Simmons e a Nazificação dos Afectos, da autoria de João Barreiros, disponível online aqui. Contas feitas os seus livros foram já publicados em 29 países e vários deles estão em fase de pré-produção para o cinema.
Esta é uma opinião ao díptico formado por Ilium (Gollancz, 595 pgs., ISBN 9780575072602, Agosto 2003) - nomeado para o prémio Hugo - e Olympos (Gollancz, 704 pgs., ISBN 9780575072626, Junho 2005) e pode conter eventuais spoilers.
O terreno da FC e mais concretamente da space-opera não é novidade para Simmons que em 1989 teve publicado o primeiro de quatro romances que viriam a trazer uma lufada de ar fresco a um sub-género que andava, na altura, pelas ruas da amargura. O já acima citado Hyperion viria a ser uma tour de force em estilo quase operático que teria conclusão em The Fall of Hyperion. Anos mais tarde seria reaberta a série com mais dois volumes, Endymion e Rise of Endymion que no entanto não mantêm o mesmo vigor e interesse dos dois livros anteriores. O leitor mais atento captará as referências literárias presentes nos títulos e logo à partida essas mesmas referências mantém-se intactas ao longo desta duologia. Não deixa de ser curioso que Simmons, que confessa ler pouca FC, se sinta tão à vontade dentro deste género. Quem visite o seu site repleto de informação saberá que ele defende que um escritor deve acima de tudo ler amplamente e em todos os modos para se cultivar, ponto de vista este que eu também partilho, embora não do ponto de vista do escritor mas como leitor. De facto de que outra forma poderá um leitor saber se anda a ler gato por lebre se o seu referencial for limitado a uns poucos de autores ou até mesmo a um género?
Ilium foi publicado em 2003 e logo a abrir o livro o decalque com a Ilíada de Homero é patente na apropriação e reescrita das linhas inicias do poema épico. Mas não demora muito a que Simmons ofereça ao leitor todo um conjunto de buzzwords que marcam a FC mais actual: nanotecnologia, pós-humanos, ciborgues, inteligências artificiais, ciberespaços, física quântica, etc.. Simmons não só se apropria destas buzzwords como lhes confere quase o foco chegando a ter alturas na narrativa em que o technobabble atinge as raias dos piores momentos de Star Trek - série que curiosamente é referida por diversas vezes - desequilibrando o conjunto quando em contraste com os momentos mais directamente relacionados com os acontecimentos da guerra de dez anos de Menelaus, Agaménon e Aquiles contra Tróia, momentos esses que são deliberadamente descritos com uma linguagem mais ponderada e até em certos momentos pretensamente elaborada.
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Autor:
Ricardo Loureiro