Conceito de Luís Filipe Silva

Ficção Científica, Fantástico, Surrealismo, Realismo Mágico, Terror, Horror, Ciberpunk e História Alternativa - e por vezes, se fôr de excelente qualidade, ainda fechamos os olhos a um certo Mainstream...

[Conheça o Manifesto]

Conto

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~ Omegalfa ~


Capítulo 3

As conversas com os colegas e o director do Instituto são animadas, mas o facto é que há bastante em jogo. O Projecto Omegalfa é um marco na carreira de todos os envolvidos. É inevitável que as opiniões divirjam e que haja várias teorias, cada qual com os seus ávidos apoiantes.

Qual a verdadeira natureza do fenómeno conhecido como o tempo? Tem um início e um fim, e o que acontece quando atingirmos esse fim? Será o final um ponto de viragem a partir do qual o tempo passa a decorrer ao contrário, e o que acontecerá então quando chegar novamente ao início? Ou será que o tempo oscila, seguindo um padrão com comportamento pendular, ou tem outro tipo de regularidade? Ou sera que o tempo progride eternamente, sem começo nem fim? E o que significa isto para o Homem, para a sua visão da vida e do universo, para as ideias de criação e evolução e essencialmente para a perspectiva de si mesmo? O Projecto Omegalfa é uma experiência focada precisamente neste tema e Jacques desempenha nele um papel fundamental que marca a sua vida, apesar do falhanço infeliz do projecto.

Ontem será sem dúvida um dos dias mais impotantes da sua vida e da sua carreira científica. Em casa também há motivos para celebrar. Em breve a família ver-se-à reduzida. Timmy disse a sua última palavra há bastante tempo, não passa de um bebé que passa a maior parte do dia a dormir e não tardará muito que Johanna tenha de passar por uma operação dolorosa que devolva o filho à barriga da mãe.

 

Capítulo 2

Jacques encontra-se numa fase óptima. No Instituto, está sobrecarregado de trabalho para os primeiros preparativos do Projecto Omegalfa, algo que lhe traz uma satisfação completa. O mais importante é que sabe, com certeza absoluta, que o fracasso do Projecto tão amaldiçoado não é responsável pelo retrocesso do fluxo do tempo, uma vez que este falhanço deplorável encontra-se muito no passado e o tempo ainda continua a avançar ao contrário. A sua teoria sobre o movimento oscilatório aleatório do tempo, sem um começo ou um fim determinados, fica assim provado e para ele, é o momento cimeiro da sua carreira científica. Que estivesse disposto a pagar pelo trabalho da sua vida com a morte, eis o que outra pessoa jamais conseguiria entender, mas, pensando bem, o leigo não entende como funciona a mente de um cientista. Valeu a pena, apesar de tudo trata-se de um enorme sucesso para si.

Mas a vida privada também é fonte de satisfação. Já não se consegue notar a gravidez de Johanna. Em breve irá voltar a ter a menstruação e o evento traumático no hospital irá tornar-se numa memória suportável. Sem o filho, a vida familiar sem dúvida que se tornará um pouco mais imprevisível e irregular. Ontem, por exemplo, estão a pensar ir ao cinema.

O desaparecimento do filho deu origem a alguns momentos filosóficos. Afinal, o filho, cujo nome a atribuir ainda não conseguiram chegar a acordo, simboliza a humanidade enquanto é engolida pelo tempo, indíviduo por indivíduo, geração por geração, até que a humanidade volte a unir-se aos primatas. É possível uma maior extrapolação, este retorno pode estender-se até ao ponto em que as criaturas unicelulares forem as únicas formas de vida na Terra, seguido de um período extenso sem qualquer forma de vida. Os que acreditam na teoria da criação debatem-se com um problema adicional: a ideia de um criador que subitamente desfaz o seu feito, após o qual nada existe, parece-lhes bastante irrealista. Um regresso gradual a uma idade primeva é algo mais aceitável, mas nem todos encaram a vida com desprendimento científico.

 

Capítulo 1

Entretanto, Jacques já abandonou Johanna, depois de um encontro bastante agradável numa festa. Regressou a casa dos pais, que o acolheram com bastante emoção. No entanto, não tem tempo para apreciar ao máximo a vida de solteiro. Folheia continuamente a dissertação de mestrado, percebendo que terá de começar a dividi-la em blocos de anotações.

Mas há mais: acabou de receber a carta de aceitação do Instituto para o qual trabalhou durante tantos anos, dedicando-se com paixão à investigação que lhe moldou a vida. Candidatava-se a um emprego directamente relacionado com os estudos a que se iria dedicar. O conhecimento prático da área já lhe desapareceu, mas tem um conhecimento teórico sem rival. À medida que os estudos progridem, irá focar-se cada vez mais nas bases do tema.

Os próximos anos são promissores. A relação com os pais torna-se mais íntima e a vida, mais espontânea. Tudo indica que o espera uma infância feliz, culminando numa abençoada ignorância.

 

Prólogo

O pequenino Jacques festeja alegremente o acto de devolver a prenda dos seus cinco anos ao embrulho com que a envolve, atando, no fim, o cordão com um nó. Era um relógio!

Os pais já perceberam o fascínio do miúdo por relógios – de pulso, de parede, com alarmes, cronómetros, de todos os tipos, desde que meçam o tempo. É habitual que Jacques invente fantasias bizarras que envolvam estes objectos, evidência inquestionável de uma imaginação vívida e de uma mente aguçada. Claro que não constitui surpresa, perante a lembrança do futuro glorioso que teve, mas quem adivinharia que esta paixão se arrastaria até aos seus primeiros anos de infância?

Por vezes, os pais perguntam-se como é que este interesse irá nascer, que incidente dará azo ao fascínio do filho pelo fenómeno do tempo. Tencionam manter-se atentos a Jacques, mais que o normal, durante aqueles primeiros e tenros anos, até que o tempo volte a chamá-lo para junto de si.

 

Título original: Omegalpha

Tradução de Luís Filipe Silva

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Autor:
Frank Roger