O orador fez uma pausa, e eu modifiquei o meu padrão de recepção.
Quando ele iniciou a segunda leitura, comecei a imaginar o que as palavras diziam. E quando terminou a estória, eu tinha na cabeça uma imagem de Zenóbia, a cidade construída em terreno seco sobre altíssimas palafitas, e suspeitava que a minha imagem seria diferente da imagem possuida por qualquer dos outros membros da audiência, mas isso não me preocupava. Provavelmente, era mesmo assim que devia ser.
E continuou a falar das cidades, com as sucessivas descrições de Marco Polo a Kublai Kan, a descrição de Leónia, a cidade cujo destino último é ficar afogada no lixo que produz, ou Octávia, a cidade teia de aranha, construída sobre um precipício entre duas montanhas escarpadas, ou Períncia, a cidade dos monstros, edificada seguindo com exactidão os cálculos dos astrónomos, ou ainda Tecla, cuja construção nunca acaba para que não comece a destruição. E eu era como se fosse o próprio Kublai Kan, que tem que imaginar as cidades a partir das descrições de Marco Polo, e que a certa altura lhe pergunta por Veneza, e Marco lhe responde que em cada cidade que lhe descreveu há um pouco de Veneza.
Quando o orador fechou o livro, todos bateram palmas, e eu senti-me de repente como se fosse arrancado a um mundo imaginário, e no entanto, num certo sentido, mais real do que a realidade quotidiana.
Perguntei ao Luís:
- Fazem isto muitas vezes?
- Uma vez por mês. Porquê, gostaste? Podes inscrever-te no Clube e eles avisam-te sempre que houver leituras...
E sorriu, ironicamente, como a querer dizer «Já viciei outro».
E eu sorri de volta, pensando «A vida não é perfeita, mas aproxima-se disso...»